quarta-feira, 21 de agosto de 2013

FILOSOFIA DA LINGUAGEM II – A SEMIÓTICA DE PEIRCE E O ANTIPSCOLOGISMO DA LÓGICA




A primeira crítica do psicologismo da lógica de depois de Mill e Kant foi feita por Peirce. Inventor de uma semiótica, uma doutrina, uma teoria, quase formal, necessária, universal, dos signos, não só da linguagem, mas de todo e qualquer signo. 

Na juventude, criticou que reduzir a logica à psicologia é equivocar-se sobre a natureza do estudo da lógica, que não estuda o pensamento, a não ser se ele se exprima em signo. Não como alguém pensa o pensamento de outra pessoa, mas como qualquer pensamento pode ser exprimido em signos. Significa que é a própria forma dos signos que significa alguma coisa. Pela forma como estão organizados, os signos significa alguma coisa. 

É possível então interpretar uma palavra, um sinal, pela forma como ele se apresenta para nós, independentemente de quem emita ou pense algo, mas é a possível da interpretação pela forma da manifestação fenomênica que está na base da refutação do psicologismo na lógica. Peirce faz uma semiótica baseada na fenomenologia e tenta uma classificação dos signos mais abstrata possível, baseadas nas suas categorias fenomenológicas. 


O argumento de Peirce contra o psicologismo na concepção kantiana da lógica

A concepção kantiana da lógica não abandona o psicologismo, pois pretendia ver os símbolos como expressões ou produtos da ação mental. Pela concepção de Kant, o processo de pensar começa a ser realizado subjetivamente, para posteriormente se passar a compreender como se relaciona os símbolos que se usam para exprimir os pensamentos, o que disso resulta serem os símbolos (palavras, signos em geral, etc.), objeto próprio da lógica. 

Peirce refuta e propõe a superação do psicologismo em termos simbólicos, ou seja, através de uma linguagem formal que se propõe superar o modelo mentalista, subjetivista de representação herdado da filosofia moderna. Se em Mill, Peirce encontra o que considera “pior que errôneas” na compreensão da lógica – pois aquele a entendia como operações do entendimento, como atos da mente, ou fatos do intelecto –, em Kant, Peirce aponta para um relativo avanço, ao considerar que na concepção kantiana o psicologismo não estava em sua essência, porém, ainda compreendendo de algum jeito, que as formas lógicas exprimem conteúdos mentais.

Nesse sentido, Peirce argumenta que a Lógica ocupa-se dos próprios símbolos e não da ação da mental a partir dos símbolos. Ao inverter a direção do processo, a lógica deve ser vista como uma análise dos símbolos – pensados por um sujeito ou não; entendidos ou não; manifestados sejam palavras, preposições, argumentos, em signos em geral; estando em alguma mente ou não –, para depois se chegar ao pensamento, por eles produzidos.

Não há, portanto, espaço para mentalismo. Analisa-se a forma do símbolo, e pela forma, estruturam-se os pensamentos para que estes correspondam aos fatos. A linguagem se apresenta aqui como forma de expressão da manifestação material do pensamento, onde o significado está na palavra ou em outras representações materiais. A lógica se ocupa, portanto, das condições necessárias para que algo seja representado. Na análise da representação, pela lógica, a ideia formal em que se ocupa a análise, manifestasse na proposição de símbolo, uma vez que a representação possui denotação (aplicação do símbolo ao objeto) e conotação (possibilidade de ter um significado), ou seja, a representação ao se relacionar com o objeto representado pode ser, pela lógica, analisado quanto à sua verdade ou falsidade. 



O lugar da semiótica na classificação das ciências de Peirce e sua relação com a estética e a ética

Peirce propõe-se analisar a semiótica na classificação das ciências que elaborou, considerando-a uma superação à lógica aristotélica, e o fez ao caminhar para um realismo metafísico, onde há uma doutrina formal dos signos, e, portanto, a semiótica se relaciona com a estética e a ética, sendo marcada pela originalidade em seu embasamento, pois enquanto a estética ocupa-se do que deve ser admirável em si mesmo (e por isso acha atenção dos sentidos), bem como a ética ocupa-se do que deveria ser admirável na ação, ela (a semiótica), enquanto categoria das ciências normativas se destaca por ir além, ocupando-se do que é admirável no pensamento, uma vez que o ato de pensar é considerado uma ação.

A semiótica, portanto, enquanto ciência normativa ultrapassa a análise da linguagem, abordando todo e qualquer tipo de signo, de veículo de significação de qualquer fenômeno percebido. Sua busca é entender o processo de significação, e não os signos em si mesmos, ou as formas de linguagens em si mesmas, já que seu escopo é compreender as condições que são necessárias para que os signos possam desenvolver suas funções.

Na análise das classificações das ciências proposta por Peirce, a semiótica é um dos tipos das ciências normativas. Ao lado da ética e da estética (e resguardadas as suas diferenças acima apontadas, a partir de seu caráter de originalidade), a lógica, enquanto semiótica é uma ciência normativa, pois visa analisar as condições necessárias para se conseguir algo que tenha o proposito como um de seus elementos essenciais. 

Tais ciências objetivam a compreensão de como o sujeito se relaciona com os fenômenos e como as ações devem ser a partir de então. Busca-se, portanto, os elementos que definem tais ações, considerando seus fins estabelecidos em determinadas conjecturas. Possuem o caráter de normatividade uma vez estabelecerem as condições necessárias, ou seja, as normas, para que se possam atingir os determinados fins estabelecidos.

Ressalta-se que as ciências normativas são uma subclasse (ao lado da fenomenologia e da metafísica) da Filosofia, ou cenoscopia, que por sua vez é uma classe do sub-ramo das ciências teóricas, a saber, a classe das ciências da descoberta, ou heurística. 



O que é um signo? É necessária uma mente humana para interpretar um signo?

O signo pode ser compreendido como algo que é capaz de ser interpretado e que diz algo acerca de um objeto. Nas palavras de Peirce, “ele é um signo para algum pensamento que o interpreta”, também “é um signo por algum objeto ao qual, nesse pensamento, ele é equivalente”, bem como “é um signo sob algum aspecto ou qualidade, a qual o coloca em conexão com o seu objeto”.

Esse processo de semiose, ou seja, interação entre os signos, se dá, sendo a concepção peirciana sem a necessidade de nenhuma mente humana para que os signos possam sejam interpretados, podendo existir signos que interpretam outros signos, como um computador. Ora, o signo como algo que é possível de interpretação e que revela alguma coisa do seu objeto, é aquilo a que o signo e quem/o que o interpreta se referem. Os objetos que podem ser signos constituem o universo do discurso, onde qualquer coisa pode ser um signo, e para se compreender do que se trata, é preciso que esse signo seja interpretado. Há, portanto, nessa análise do signo a necessidade de uma relação triádica, entre o signo, o objeto e o interpretante.


Como podem ser os signos classificados? Quais são as ideias básicas de cada classificação?

Já que na análise dos signos é preciso considerar suas funções lógicas do processo de significação, os signos podem apresentar três classificações que levam em consideração a relação que possuem a si mesmos, aos seus objetos ou aos seus interpretantes. 

No sentido de “a si mesmos”, os signos podem ser classificados quanto à sua própria natureza material, ou seja, a ideia de pura possibilidade, de vagueza, de uma qualidade sensitiva sem determinação. Peirce apresenta as denominações:

a) qualissigno, quando um signo é da natureza de uma aparência;

b) sinsigno, quando um signo é um objeto ou um evento individual;

c) legisigno, quando um signo é da natureza de um tipo geral.

No sentido de “aos seus objetos”, os signos transmitem a ideia de existência, de dualidade, de singularidade ou efetividade fática. Peirce apresenta as denominações da tricotomia:

a) ícones, representando seus objetos apenas na medida em que eles se assemelham de forma mútua;

b) índices, representando seus objetos independentemente de qualquer semelhança entre eles, somente em virtudes de suas conexões reais com eles;

c) símbolos, representando seus objetos também independentemente de qualquer semelhança ou qualquer conexão real, mas em razão de disposições ou hábitos de fato de seus interpretes, que asseguram que sejam entendidos de certa maneira.

No sentido de “seus interpretantes”, os signos transmitem a ideia de relação lógica necessária, de generalidade, lei ou regra. Peirce denomina-nos em:

a) rema, um verbo na linguagem gramatical;

b) signo dicente, como uma proposição, um signo capaz de ser asserido;

c) argumento, que demonstra qual é seu interpretante pretendido, como uma lei, regra necessária.


BIBLIOGRAFIA:

PEIRCE, Charles S. O que é um signo? Em: MARCONDES, D. (org.). Textos Básicos de Linguagem – De Platão a Foucault. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2009, pp. 72-78. 

RODRIGUES, Cassiano Terra. Filosofia da Linguagem I: Guia de Estudos. Lavras: UFLA, 2013, p. 34-48.


OBSERVAÇÃO: 
Este texto é um resumo que produzi com o material de aula de disciplina “FILOSOFIA DA LINGUAGEM I” da Graduação em Licenciatura para Filosofia da UFLA – Universidade Federal de Lavras EaD Campus Governador Valadares, produzido em 21/08/2013.


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